Por Marcelo Abritta*
Analisando o passado recente do Brasil, é fácil enxergar como tem sido desfavorável a relação entre políticos e empresários, principalmente no que tange o oferecimento de serviços, sejam eles públicos ou comerciais.
Desta forma, apesar de ser compreensível o movimento dos caminhoneiros contra os impostos abusivos sobre os combustíveis, a categoria parece cometer um grande equívoco com a reivindicação de uma tabela de valores mínimos de frete.
A medida, divulgada pelo governo federal no último dia 30, promulga, em “caráter obrigatório para o mercado de fretes do país”, preços mínimos definidos de acordo com o quilômetro rodado. Com isso, foi dado o primeiro passo em direção ao fatiamento do mercado entre as grandes transportadoras.
Com certeza isso resultará, dentro de poucos anos, na exclusão dos caminhoneiros autônomos, que terão dificuldades para conseguir sobreviver, além da cobrança de preços abusivos e da corrupção generalizada, algo que hoje vemos acontecer no segmento de transporte de passageiros.
Para exemplificar, vejamos: se o preço do frete for o mesmo, quais serão as chances de um autônomo competir com uma grande empresa? Por sua vez, a grande empresa conta com vendedores profissionais, além de uma malha de cobertura mais ampla, frequências regulares e condições de pagamento mais favoráveis. Já o autônomo tem apenas seu próprio trabalho a oferecer.
Os caminhoneiros autônomos, então, estarão proibidos de oferecer preços menores para competir com as grandes empresas. Aos poucos, eles serão forçados a abandonar a profissão, ou pior, serão agregados das grandes empresas, trabalhando mais e ganhando menos.
Pouco a pouco, a participação de mercado das grandes empresas irá crescer. Nos bastidores, os maiores empresários irão combinar entre si o fatiamento do mercado de frete e transporte brasileiro. Quatro ou cinco famílias, em conjunto, farão lobby por preços mínimos cada vez mais altos. As portas estarão abertas para a corrupção.
Por fim, os clientes irão arcar com valores de frete abusivos, que serão repassados aos custos de todos os produtos distribuídos via transporte rodoviário, enquanto grandes empresários lucram alto.
Tais previsões podem parecer apocalípticas, porém foi justamente o que aconteceu no transporte de passageiros, passo a passo, pouco a pouco. Nas rodoviárias do Brasil, onde atuam apenas concessionárias, quase não há mais pequenas empresas, e quase não há mais alternativas. O que se vê são grandes corporações e preços abusivos.
É importante ressaltar as dificuldades vividas pelos caminhoneiros e considerar a coragem em se rebelar contra impostos abusivos. Entretanto, os últimos anos não foram fáceis para nenhuma categoria. Assolados por uma crise sem precedentes, pequenos empresários de todos os setores trabalham no vermelho.
Além disso, são 13 milhões de desempregados em todo o país, das mais diversas profissões. Se todos os setores pressionarem por tabelas de preços mínimos, teremos o retorno do plano cruzado e da inflação.
Sob nosso ponto de vista, uma alternativa seria uma associação dos caminhoneiros autônomos, que negociasse em conjunto, buscando melhores condições à categoria, porém mantendo livres aqueles que optassem por praticar seus próprios preços.
Tabelar o frete mínimo é o caminho para o clientelismo, para a corrupção e para a formação de um cartel entre as grandes empresas. O Brasil já cometeu esse erro e não seria inteligente insistir nele.
*Marcelo Abritta, 33, engenheiro aeronáutico pelo ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, é cofundador e CEO da Buser, empresa que une passageiros com destino em comum para fretar ônibus.