Por Rosane Menezes Lohbauer e Rodrigo Sarmento Barata*
No último dia 09 de janeiro, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), publicou a Resolução 3.220, estabelecendo critérios para a elaboração de projetos de arrendamentos portuários e procedimentos para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de arrendamento.
Não é a primeira vez que a Antaq aborda os temas. A Resolução 2.367/12 já previa, de forma menos detalhada, a realização de estudo prévio para elaboração de projetos de arrendamento portuário. A inovação trazida pela nova norma foi no sentido de detalhar mais este estudo e, principalmente, facultá-lo a qualquer interessado, vez que no regramento anterior, apenas a Autoridade Portuária poderia fazê-lo. Quanto ao equilíbrio econômico-financeiro, além de consolidar algumas normas esparsas da Agência, a Resolução também busca aprimorar a regulação setorial, assumindo compromissos interessantes para tanto.
A Resolução, de forma geral, é uma importante evolução e poderá ganhar destaque por dois motivos principais. De um lado, é uma resposta aos eventos e críticas lançadas aos projetos de arrendamento cujos leilões foram barrados pelo Tribunal de Contas da União – TCU recentemente. Do outro, é a assunção do compromisso de melhoria da regulação exercida sobre os portos.
Para contextualizar o tema, lembra-se que Governo Federal disponibilizou em Consulta Pública, no segundo semestre de 2013, as minutas de editais e contratos para arrendamentos portuários já sob a vigência da nova Lei dos Portos. Entretanto, diversas foram as críticas aos modelos apresentados, tanto por parte da iniciativa privada, como por parte do TCU, que acabou apresentando uma série de exigências como condição ao prosseguimento das licitações.
Nesse sentido, as mudanças na regulamentação da ANTAQ parecem tentar responder às críticas apresentadas por alguns players, no sentido de demonstrar que os projetos podem ser apresentados por qualquer interessado e que critérios e especificações foram estabelecidos para garantir a transparência dos procedimentos de manifestação de interesse e confiabilidade aos estudos e projetos que deles decorrerem. Como consequência, eventuais estudos que não tenham atendido aos requisitos mínimos indicados na Resolução 3.220 deverão ser complementados, haja vista a vigência imediata da norma.
No entanto, os estudos autorizados à Estruturadora Brasileira de Projetos – EBP parecem atender às especificações mínimas agora vigentes na Antaq, vez que a Portaria SEP nº 38/2013, que os autorizou, traz rol bastante semelhante ao estabelecido na Resolução 3.220. Possivelmente, portanto, não se verificará atraso no andamento dos leilões em decorrência da nova regulamentação.
Comparando a resolução até então vigente (2.367/12) com a atual, temos que a exigência do Estudo de Viabilidade foi incrementada com uma série de detalhes técnicos, tornando-o mais amplo. Exceção é feita aos estudos em terminais que manterão suas características fundamentais, que poderão se valer de estudos simplificados. Este é o caso dos atuais arrendatários que pleiteiam a prorrogação de seus contratos. Ao estabelecer a obrigatoriedade de revisão contratual e elaboração de EVTEA nos contratos vigentes, a Resolução parece abrir caminho para a discussão das prorrogações contratuais, inclusive àqueles contratos sem previsão expressa, mas que buscam reequilibrar a relação em vistas aos investimentos realizados nos terminais.
Em relação à segunda parte da norma, a Agência também trouxe importantes avanços e assumiu uma série de obrigações que, caso cumpridas com a qualidade esperada, poderão colocar a regulação do setor portuário em patamar elevado, se comparada à maioria dos demais setores regulados. Os temas abordados na Resolução, contudo, são polêmicos e demandam extrema qualidade e cautela em sua aplicação.
De início, aponta-se o fato da Agência ter assumido em Resolução a obrigação de calcular o custo de capital para o setor. O conceito de equilíbrio econômico financeiro está estreitamente vinculado à ideia de justa equivalência entre encargos e benefícios pactuados contratualmente. Em projetos de longo prazo, como são os arrendamentos, busca-se estabelecer, na fase de estudos ou modelagem, uma igualdade entre a taxa interna de retorno e custo de oportunidade do capital empregado pela iniciativa privada no projeto.
Nesse raciocínio, ao calcular o custo de capital ao longo do projeto, a ANTAQ assume a função de Reguladora Econômica e estabelece ferramenta de extrema importância para a gestão contratual. Isso porque, ao se comprometer com esta taxa de desconto, permite-se que desequilíbrios contratuais sejam ajustados conforme as condições econômicas vigentes à época do evento. Especialmente para a realização de novos investimentos nos terminais, a metodologia é de extrema importância, posto que a medida do desequilíbrio tende a ser elevada nestes casos. Estabelecer um custo de capital justo para o momento do evento mostra-se bastante acertado nestes casos.
Por outro lado, há quem veja este movimento com ressalvas, tendo em vista que alguns eventos de desequilíbrio contratual podem ser fundados em aspectos originários ao contrato, inseridos na proposta apresentada em licitação. Deste modo, adotar os parâmetros extraídos de outro momento para realização do ajuste, poderia ensejar questionamentos quanto à legalidade da medida, vez que a legislação estabelece que as condições originais da proposta apresentada em licitação deveriam ser mantidas por todo o período contratual.
A norma impõe, ainda, a realização de revisões ordinárias em todos os contratos de arrendamento, inclusive aqueles já vigentes, no máximo a cada cinco anos. Muito embora salutar a louvável a iniciativa da ANTAQ, deve-se lembrar que esta disposição não é totalmente nova, apesar das revisões contratuais não virem ocorrendo. A realização de revisões ordinárias demanda trabalho com rigor técnico e organização, evitando-se abrir espaço para renegociações contratuais ou revisões que desequilibrem o contrato. Considerando o número de contratos de arrendamento vigentes e a complexidade das revisões, o desafio é grande. Mesmo assim, deve-se elogiar a posição da Agência e torcer para que o resultado seja positivo. O primeiro passo é implementar, de maneira adequada, todas as medidas prometidas, passando a desejada credibilidade à sociedade.
*Rosane Menezes Lohbauer e Rodrigo Sarmento Barata são, respectivamente, sócia e associado do escritório Madrona Hong Mazzuco – Sociedade de Advogados (MHM).